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Resenha — Fio de Ariadne, de Caio Csizmar

  • Foto do escritor: Vitor Alves
    Vitor Alves
  • 27 de dez. de 2021
  • 4 min de leitura

Atualizado: 1 de jun.

Clipe da música: https://vimeo.com/657886354 EDIT: (Não está funcionando atualmente, ouça aqui a música original :https://open.spotify.com/intl-pt/track/59dKcG6HjEHjbHwfG314I0 )


Me coloco no papel experimental de resenhista da obra de um amigo próximo, espero que seja válida a tentativa de exercitar minhas impressões...



O caos é o princípio e também é inevitavelmente o próprio fim.


É dessa forma que ocorre o desenrolar do clipe oficial de Fio de Ariadne, a faixa mais extensa do álbum Decriptas (2021), do compositor mineiro Caio Csizmar.


Caio é um jovem compositor cuja bagagem cultural excede em muito as expectativas da tenra idade, sendo possível reconhecer em sua linguagem musical suas maiores inspirações, podendo ser citados o compositor Gyorgy Ligeti e a banda Gentle Giant.


Como todo jovem, ele está imersivo na tecnologia e virtualidade que circunda nossas ações, reações e emoções: o algoritmo que dita o mundo. Mas, ciente do mundo ilusório que dita a estética do consumo, Caio aproveita-se do absurdo do mundo para estabelecer sua música — nesse caminho, ele há de zombar, com bastante ironia e crítica, toda a mitologia fundada por esse caldeirão cultural, alimentado por todos os boomers, zoomers, coomers, grillers, millenials e todas as classes possíveis distinguíveis.



Não há melhor caminho para entender o mundo do que pela óptica dos mitos. O mito do Fio de Ariadne que dá pano de fundo à lenda do Minotauro e aos heroísmos de Teseu está presente não só em nossa narrativa moderna do dia a dia, mas também no clipe e principalmente na música.


Mas não é unicamente por esse simbolismo do mito que Csizmar estabelece sua criação, ele se aproveita também do conceito de Fio de Ariadne, ligado à lógica, em que o conceito do fio de Ariadne consiste em levar a cabo (ou seria melhor, a fio?) todas as possibilidades na resolução de um problema, mesmo que sejam tomados os passos errados propositalmente: a ideia é exaurir todos os meios possíveis, dos mais errados aos mais certos.


A direção do clipe é liderada pelo próprio compositor junto ao diretor Victor Brites. A união de duas mentes que se conectaram e estabeleceram o único clipe possível para essa música, de duração de aproximadamente 13 minutos, e gravado com recursos oriundos da Secretaria de Cultura e Economia Criativa. Nada faltou e nada sobrou na produção da Edith Cultura.



O preâmbulo inicial da música estabelece os elementos tanto do mito quanto do processo lógico do Fio de Ariadne, estamos sendo preparados para adentrar o labirinto em que o temível monstro Minotauro mora. Elementos não lineares brotam junto a quebras de continuidade. A metalinguagem envolvida na gravação da própria gravação e um cavalo aleatório ditam que o espaço habitado no clipe é o do não-espaço. O terreno e a falta de terreno para entendermos onde estamos gera um conflito que é próprio do mistério do mito. Porém, a música, com a calma de um prelúdio, não alimenta a ansiedade da confusão das imagens, assim como as paradas feitas para respiração auxiliam e administram o preparo do caos que está por vir: numa espécie de entropia.


O Fio de Ariadne é usado e começa a ser desenrolado, só que dessa vez é pelo próprio Minotauro. E entrar no labirinto é acessar o inconsciente caótico dos tempos atuais: ou dos memes atuais. Isso é bem demonstrado com todas as cenas criativas e estranhas: estamos lidando com o desconhecido cada vez mais que adentramos o labirinto.


Parece que em determinado momento, o fio do novelo de lã que nos conduz rumo ao centro do labirinto se quebra. E agora estamos a mercê do Minotauro.

A escolha da essência do caos produzido pelo algoritmo da geração Z em memes a fora pela internet é recurso perfeito para estabelecer o tom do clipe. Todos os elementos introduzidos no começo se reiteram, parece que a escolha visual e estética estabelecida segue os mesmos princípios composicionais do desemaranhamento, presentes na obra dos mestres que figuram no consciente de Caio: como Arnold Schoenberg e Camargo Guarnieri.


Como o fio de Ariadne propõe os diversos recomeços até chegar ao fim, até à mais resoluta solução do problema, somos bombardeados com o caos, nos restante apenas pequenos respiros para pensarmos numa nova rota de colisão com os problemas. Mas enfim, parece que conseguimos sair do labirinto. E quando saímos dele não apenas nos reencontramos com o cavalo aleatório, mas chegamos a um lugar vazio, um lugar sem significação. Nós não voltamos ao começo.


Após a jornada feita através do labirinto, agora sabemos que a vida se trata do percurso… e talvez a parte mais divertida dela tenha sido o atravessar o labirinto caótico que é viver.


O passeio pelo labirinto, o encontro com o Minotauro e a escapada através do Fio de Ariadne demonstra que o caos é importante para reconhecermos a paz.

Todo o conjunto da obra, o caótico dos instrumentos, melodia, harmonia e ritmo é extremamente bem elaborado e bem tocado. Os elementos do clipe adornam o espetáculo sonoro e aumentam a premissa dada pela música.


Penso agora que talvez o maior exemplo da genialidade feito até hoje na iniciante carreira desse compositor seja o esforço em estabelecer o verdadeiro caos, que não seria possível sem seu extremo perfeccionismo.


O cavalo aleatório
O cavalo aleatório

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